Finalmente cruzamos a Linha do Desespero
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Recentemente uma turma de autodenominados humoristas realizou um espetáculo em São Paulo, onde o humor seria calcado no preconceito. Haveria piadas sobre todo tipo de clichês: negros, gordos, gays, judeus, etc. o público, provavelmente compartilhando a mesma mentalidade resumida dos autodenominados humoristas, teve que assinar um documento comprometendo-se a não se ofender com qualquer ataque de injúria travestido de humor perpetrado naquele lugar – documento sem nenhum valor legal, diga-se de passagem. Logo no início da ocasião, um dos pseudoartistas fez uma conexão entre negros e macacos, fazendo com que o tecladista daquela apresentação, negro, se retirasse e acionasse a Polícia Militar.
Pouco tempo antes, um cartunista de certo órgão noticioso estava em um restaurante acompanhado da namorada e da mãe. Lá pelas tantas, quis ao banheiro, mas dirigiu-se ao feminino ao invés do masculino. Certa senhora, acompanhando a neta de dez anos, não aceitou a presença do cartunista, que gosta de se vestir de mulher, e este revidou aprontando um escarcéu, fazendo com que movimentos gays, em nítida falta do que fazer, o apoiassem e chamassem a todos os opositores, como sempre, de homofóbicos, apesar de o cartunista, mesmo com a maluquice se ser cross-dresser, não ser propriamente homossexual, já que namora uma mulher.
Francis Schaeffer, se estivesse vivo, certamente diria que ultrapassamos a Linha do Desespero. Na sua trilogia (“O Deus que intervém”, “A morte da razão” e “O Deus que Se revela”) ele traça um estudo sobre este fenômeno, mas restringiu seu foco sobre a Europa e os Estados Unidos. A Linha do Desespero é a passagem de uma cosmovisão teísta (mesmo que não necessariamente cristã) para uma cosmovisão existencialista pura e simples, quando nada do que fazemos, vivemos ou sentimos faz sentido; tudo se torna, como bem diz Salomão no Eclesiastes, vaidade, vazio e correr atrás do vento. Tal limite é ultrapassado quando o cristianismo se torna irrelevante devido a suas bases serem minadas.
Schaeffer identifica, tanto na Europa quanto nos EUA, o liberalismo teológico como elemento corrosivo da cosmovisão cristã naqueles dois locais. Quando se relativiza a autoridade da Palavra, ou quando engessa-se sua inspiração na gaiola da inerrância, perde-se ou desmoraliza-se por completo qualquer base autoritativa de sentido de vida que possamos ter. Afinal, é a Bíblia que nos revela Deus em Cristo; é a Bíblia que nos mostra Seu tremendo sacrifício morrendo pelos eleitos; é a Bíblia que nos mostra o terrível juízo de Deus contra o pecado.
Hoje o liberalismo teológico possui duas formas que, se aparentemente são diametrais, essencialmente são farinha do mesmo saco. Ora traveste-se de roupas finas e chiques; ora desce do pedestal e coloca chapelão de cowboy. O moderno inimigo da cruz não a ataca de forma abjetamente explícita, mas antes cita poetas brasileiros e escritores russos – podendo também se valer de uma argumentação ad hominem, em que quem profere a mensagem é a própria fonte autoritativa dela. Ambas as formas negam a autoridade das Escrituras, relativizando-a: uma de forma pseudointelectualizada, preocupada com a maneira com que a mensagem do amor de Deus pode chegar ao homem do século 21; a outra de forma atabalhoada, mas não menos voraz em seu avanço em querer tomar corações e mentes para si. Ambas as formas de neoliberalismo teológico negam o sacrifício de Cristo: uma, ao realocar o atributo do amor de Deus sobre todos os outros, inclusive sobre a soberania (que foi riscada do mapa), fazendo com que, em última análise, o universalismo soteriológico seja a única alternativa viável (concordando com o fundador da LBV, Alziro Zarur, que escreveu o “Poema ao irmão Satanás”); a outra, ao atrelar à salvação valores monetários e atitudes humanas, fazendo com que João Tetzel fique, enfim, orgulhoso por ter gerado discípulos.
Isso tudo desmoraliza o cristianismo bíblico. Se não somos mais o sal da terra, qualquer alternativa de vida se torna válida. Se Deus não existe, como bem disse Dostoiévski, tudo é permitido. Tal como Jonas, a tormenta que se abate sobre nossa sociedade é culpa nossa. Afinal, o que dizer de determinado telebaalista (“televangelista” é muita concessão!) que não desmentiu ser chamado de “Ratinho evangélico”? E isso ainda é muito injusto, já que Ratinho, no seu programa, tem momentos de lucidez, diferentemente de sua contraparte religiosa.
Nossa cosmovisão cristã se tornou peça de museu. O teísmo aberto e o neopentecostalismo são duas faces da mesma moeda existencialista, que tentam dar as cartas no cenário religioso atualmente abraçando uma cosmovisão fruto da Linha do Desespero. Sinais da apostasia que se abateu sobre nós. Que Deus nos dê graça para passarmos os dias que se avizinham!
Digão sempre admirou o posicionamento profético de Schaeffer aqui no Genizah
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