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Ontem foi o dia da Língua Portuguesa


Fabricio Cunha

Pensei na professora Ivana. As lembranças não são boas. Ela perseguiu as três gerações de “Cunhas” no Colégio Nossa Senhora Aparecida, onde estudamos. Sou o mais velho e minha relação com a professora de Língua Portuguesa foi tão turbulenta, que alcançou o Fredy, meu irmão mais novo.

Se é das intempéries que colhemos os melhores frutos, dessa, colho uma paixão pela língua portuguesa. E dos três irmãos, sou, talvez, o mais desprendidamente apaixonado. Amo-a de graça. Meus irmãos a amam por ofício. Fredy é jornalista, Pity é professora. Eu não sou nada e por isso minha paixão pelo “português” se legitima na despretensão.

Que língua linda. Tão solta e tão presa ao mesmo tempo. Tão etimologicamente respeitosa e tão fonologicamente livre, quase irresponsável.

Esses dias mesmo parei um tempão pra ouvir um senhor falando. O sotaque era carioca. A fala era tão solta e leve, que o assunto irrelevante se mostrou interessantíssimo só pela liberdade com que falava.

E ouvir um português de Portugal, que estética rigorosa e que fonética rápida como quem fala constantemente em ritmo de “repente”.

Mas o que me encanta é sua oralidade, tão peculiar no Nordeste brasileiro. A criatividade do nordestino mais a versatilidade abusada da língua, inventam neologismos a cada fração de segundo, que são incorporados ao cotidiano sem que quase se perceba.

Obrigado, professora Ivana.

Obrigado pelas repreensões em metáforas, pelas críticas em hipérboles, pelos sermões sindéticos e assindéticos, por me obrigar a usar os pronomes com rigor e cantarolar o “caso oblíquo” e as preposições (a, de ante – bis – com, desde, em…). Usei muitos eufemismos para me referir a vossa senhoria, já que as metonímias não dariam conta.

Mas, porém, todavia, contudo e entretanto, todos temos nosso perseguidor e nessa relação prosopopeica, quem me pega no pé são as crases.

Que a língua seja celebrada e cuidada. Que seja oralmente livre, mas que preserve sua beleza estética com rigor. E que não sucumba à corrência da internet.

Salve a língua portuguesa.


Originalmente no blog do autor







 

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