Jordicleison Messias de Jesus, o divino

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Digão

Jordicleison era um sujeito meio lesado na vida. Seu sonho sempre foi ser marinheiro. O problema era encontrar algum escritório da Marinha em Palmitópolis, cidadezinha do centro-oeste do Brasil. Tinha também que vencer o pavor que tinha de água, desde quando fora batizado por engano porque entrou na fila pensando que era tarde na piscina do SESC. Mesmo não tendo SESC em sua cidade.

Mas, como havia sido batizado naquela igrejinha simples (tinha um violão Tonante que vivia desafinado, um microfone surrupiado de um aparelho 3 em um da Sharp dos anos 70 todo remendado com fita crepe e um alto-falante Frahm), resolveu ficar por ali. Como era meio lesado, fora nomeado presbítero. Achava que podia ajudar no louvor e resolveu tocar o Tonante desafinado nos cultos de quarta-feira à noite, quando geralmente só compareciam algumas velhinhas depois do horário da novela. Apesar de não saber nem encontrar um dó maior no violão, começou a fazer sucesso entre as irmãs que compareciam – três, para ser mais exato: sua mãe, sua tia meio surda e uma vizinha de infância amiga de sua mãe, que sempre teve pena de Jordicleison, por ser meio lesado.

Apesar de estar conseguindo sucesso na igreja que freqüentava, Jordicleison não estava totalmente contente. Seu intento de ser marinheiro não estava sendo alcançado. E todos os seus intentos deveriam ser alcançados, como seu pastor havia pregado em seu último sermão, quando disse: “a Bibra diz que Xoão viu um castelo descê das núvi!”, e ele achou que este castelo tinha ligação com o Castelo de Caras, aonde todas as subcelebridades vão levar seus silicones de estimação para passear. Ou, talvez, com o Castelo de Greyskull, onde He-Man tem a força. Só não podia ser associado com o Castelo Rá-Tim-Bum, porque havia tido uma revelação que Rá era um deus egípcio, Tim era o Tim Maia que morreu e Bum o barulho de uma explosão, significando, portanto, que Rá-Tim-Bum é uma coisa do capiroto. Por isso, achou que seria marinheiro, mesmo morando no centro-oeste.

Mas o que ele não havia dito para ninguém é que ele queria ser marinheiro para encontrar seu pai desaparecido. Jordicleison nunca o conhecera. Nem mesmo sua mãe, dona Farinácea. Em sua juventude, ela tinha o costume de sair com vários rapazes ao mesmo tempo, no que resultou em sua gravidez. Até hoje ela crê que sejam dois os possíveis pais de Jordicleison: o time de futebol reserva do Íbis, quando fez uma turnê em Palmitópolis, e o Coral dos Cantores de uma Praga (não é um coral de Praga, na Europa, e sim de uma praga, pois cantavam muito mal). Por tudo isso, dona Farinácea ganhou um apelido que tentava esconder de Jordicleison. O que não era difícil, porque ele nunca entendia direito quando perguntava “mãe, como é trocar o F pelo G em seu nome?”

Certo domingo, o pastor de Jordicleison aproximou-se de dona Farinácea, como quem não quer nada. Este era o método que ele usava quando queria uma oferta generosa para poder saldar a prestação do Uno 93 que comprou em nome da igreja. Mas desta vez ele não estava pensando no Uno – que já estava quitado, diga-se de passagem, apesar de ele ainda puxar as ofertas gordas. Conversa daqui, conversa dali, ele descobriu que dona Farinácea era, na verdade, a adolescente Galinácea do seu tempo de farra, quando jogou no Íbis e cantou no Coral dos Cantores de uma Praga, o que fazia dele o pai de Jordicleison. Com esta revelação, Jordicleison subiu de posto na igreja, tornando-se pastor auxiliar, mesmo sem saber nada de pregação, Bíblia ou ensino bíblico. O que fazia dele a pessoa perfeita para o posto, pois não faria sombra no pastor-papai, que também não sabia nada de pregação, Bíblia ou ensino bíblico. 

Algum tempo depois de ser empossado pastor, sua mãe decidiu morar com Robaldo Furtado, o pastor. Assim, chamou Jordicleison para conversar.

- Meu filho, precisamos conversar.

- Quié, manhê? Disse Jordicleison, como um adolescente, apesar de ter 37 anos e ainda morar com a mãe.

- Jordicleison, descobri que o pastor Robaldo Furtado é o seu pai, e vou juntar os trapos com ele.

- Bem vi que a senhora estava dando uns pegas nele e imaginei se aquilo seria o novo tipo de unção que seria lançado no próximo ano.

Assim, Robaldo Furtado e Farinácea passaram a morar juntos. Resolveram passar a lua-de-mel em Guarapari, aproveitando as propriedades radioativas a areia preta e estudando o local para aplicar novo golpe, ou melhor, expandir a obra da igreja. Com a ausência e Robaldo, Jordicleison assumiu definitivamente a direção da igreja. Como era meio lesado, fez com que a igreja crescesse, prometendo fazer chover, garantindo que a igreja teria uma linha de shampoos e condicionadores que fariam a alegria das irmãs e implementando novidades como o torneio de UFC Gospel – até já tinha o lema: batei na cara e abrir-se-vos-à o supercílio. Para prender a juventude, lançou o funk Irmãzinha Safadinha, cuja letra edificante dizia o seguinte: 

Vai descendo até o chão

Vai se enchendo de unção

Que garota safadinha

Ela é minha irmãzinha

E era só, repetindo 487 vezes. Foi um tremendo sucesso, gerando até contrato com a gravadora Som Livre Gospel e aparições no Gugu, Faustão, Luciano Huck e Ana Maria Braga. O ministério era bem sucedido, mesmo ele sendo meio lesado. E o povo que o acompanhava era ainda mais lesado que ele, dando sustento às suas idéias mirabolantes. Mas isso fica para a próxima.

Digão não é ave-maria, mas está cheio de graça aqui no Genizah