TRANSCENDER - Ir além do que os olhos vêem
Hermes Fernandes
Transcendência não é fuga da realidade, mas um mergulho mais profundo nela, em busca de seu significado. Não tem nada a ver com uma hiper-espiritualidade, que se encerra dentro de si mesma, mas de uma espiritualidade que nos projeta para fora de nós mesmos.
Com os olhos iluminados, podemos enxergar o mundo de um novo prisma. Não há nada que deva ser considerado comum (At.10:15). As coisas ordinárias passam a ter valor extraordinário, pois são como que transfiguradas ante aos nossos olhos.
No evento conhecido como Transfiguração, os três discípulos escolhidos por Jesus para testemunhá-la, avistaram atônitos quando não apenas o rosto de Cristo se transfigurou, mas também as suas vestes (Mt.17:2). Não havia nada de especial na roupa usada por Jesus. Era confeccionada de tecido comum àquela região. Provavelmente foi costurada por sua mãe ou alguma costureira da comunidade. Porém, quando o Filho de Deus foi transfigurado à vista dos Seus mais chegados discípulos, Suas vestes resplandeceram como se fossem celestiais.
A realidade à nossa volta está impregnada de glória. Porém, nossos olhos carnais são incapazes de percebê-la. Necessitamos de olhos iluminados para discernir as coisas espirituais (Ef.1:18). Pensar nas coisas de cima não é ficar pensando em como será o céu, e sim, captar os sinais celestes em nosso cotidiano (Cl.3:2).
Passamos a ver Deus até nos momentos mais críticos e nas crises mais agudas pelas quais atravessamos. Tudo recebe um novo significado. A exemplo de Paulo, que da prisão escreveu aos Filipenses: “E quero, irmãos, que saibais que as coisas que me aconteceram contribuíram para maior avanço do evangelho” (Fp.1:12). Em vez de ficar amargurado, questionando a Deus pelo fato de estar preso injustamente, Paulo preferiu fazer uma leitura completamente diferente da situação, enxergando nela um propósito divino. Não é a realidade que muda, e sim leitura que fazemos dela. E é esta leitura que chamamos de transcendência.
Uma vida transcendente não pode ser centrada no próprio umbigo. Enxerga-se o evento particular em conexão com o todo. É o todo que confere um novo significado às partes. Por isso Paulo diz que todas as coisas cooperam em conjunto para aqueles que amam a Deus, e que são chamados segundo o Seu propósito (Rm.8:28).
Vivenciamos momentos de lampejo de transcendência. De repente, o que não fazia qualquer sentido é revestido de beleza singular. Foi num lampejo como esse que Paulo e Silas começaram a louvar a Deus, ignorando a dor causada pelas chibatadas (At.16:25).
A transcendência nos faz considerar o propósito de que todas as coisas e eventos estão carregados. As dores de parto são suplantadas pela vida que delas emergirá (Jo.16:21).
O melhor referencial de que dispomos para um estilo de vida transcendente é o próprio Jesus. Hebreus diz que Jesus só foi capaz de suportar a cruz, porque tinha em vista a alegria que lhe fora proposta (Hb.12:2). É sobre isso que profetiza Isaías: “...quando a sua alma se puser por expiação do pecado (...) Ele verá o trabalho da sua alma, e ficará satisfeito” (Is.53:10-11).
Até a maneira como encaramos a morte é afetada. Ela já não se constitui um inimigo invencível, mas algo natural que possibilita a emergência de novas gerações. O mundo não suportaria por muito tempo se novas gerações chegassem sem que as anteriores partissem.
Jesus disse aos Seus discípulos: É importante que eu vá, para que o Espírito Santo venha (Jo.16:7). Esta mesma consciência havia em João Batista, que em vez de sentir-se ameaçado com a crescente popularidade de Jesus, disse consciente: Convém que Ele cresça, e eu diminua (Jo.3:30).
Portanto, transcender não é alcançar um tipo de nirvana ou hiper-espiritualidade, e sim enxergar a importância de todas as coisas em conexão com o Todo e com Deus.
Isso nos possibilita ver Deus nos lugares e situações mais inusitados. A vida deixa de ser dividida em departamentos separados. Tudo se harmoniza. Não há dualismo. Não há mais distinção entre o que é sagrado e o que é secular. Todas as coisas são puras para os puros (Tt.1:15).
Podemos enxergar a beleza nas diversas manifestações culturais, entendendo-as como resultantes da graça comum. Imagine sentir a presença de Deus enquanto ouve uma canção de Tom Jobim, ou enquanto assiste a um balé no Teatro Municipal!
Se teus olhos forem bons, ressaltou Jesus, todo o teu corpo será luz (Mt.6:22-23). Esta é a experiência da transcendência.
Não se trata de descobrir onde Deus está, e sim, onde Ele não estaria. O Salmista experimentou tal sensação de transcendência, quando compôs o Salmo 139:
“Tal conhecimento é maravilhoso demais para mim; elevado demais para que possa atingir. Para onde me irei do teu Espírito? Para onde fugirei da tua face? Se subir ao céu, tu ái estás; se fizer nas profundezas a minha cama, tu ali também estás. Se tomar as asas da alva, se habitar nas extremidades do mar, ainda ali a tua mão me guiará e a tua destra me susterá”(Sl.139:6-10).
Enxergar a vida deste prisma é como se tudo ao nosso redor se tornasse translúcido, transparente, banhado por um raio de luz que lhes intensifica o relevo, a estrutura e as profundezas.
A luz que ilumina a todos os homens (Cristo) não apenas passa roçando a realidade, mas a penetra e a revela como de fato ela é.
O convite do Evangelho é que o homem experimente em Cristo a verdadeira transcendência, discernindo o som de cada instrumento, enquanto se deixa extasiar pela melodia da orquestra.
Somente alguém que experimente isso poderia dizer: Toda a Terra está cheia da Sua Glória!
Hermes, você é culpado mesmo de escrever essas coisas no Genizah, e está intimado a continuar escrevendo coisas lindas como esta.
ResponderExcluirPor acaso o Nirvana que você falou é aquele do Kurt Cobain ? ( tô brincando ) éh éh éh
A quadrilha de vocês está de parabéns !
Ótimo post, amigo Hermes!
ResponderExcluirObrigado pela palavra logo pela minha manhã.
É isso mesmo: transcender pra não viver na minhoquez da carne. A terra está cheia da Sua glória! Aleluia!
Abração, cá da terrinha!