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Espiritualidade Alienante


Hermes Fernandes

Milhões de pessoas vivem uma espiritualidade alienante, ocupando-se exclusivamente com questões espirituais e sobrenaturais, enquanto fazem vista grossa às questões ordinárias da vida. Vivem à beira de uma espiritualidade esquizofrênica, ignorando que a vontade do Pai deve ser feita “assim na terra, como no céu”, conforme a oração ensinada por Jesus.

Perdemos o contacto com a realidade que nos circunda. Há irmãos sinceros que demonstram tamanha sensibilidade para as coisas espirituais, que freqüentemente dão testemunho de visões angelicais. Alguns testemunham acerca de supostos arrebatamentos, e relatam entusiasticamente suas excursões ao paraíso. A impressão que se dá é que tais pessoas buscam uma espécie de fuga da realidade. Geralmente, são pessoas muito simples, que vivem em comunidades carentes, desprovidas de qualquer infra-estrutura.

Suas experiências espirituais são a maneira de responderem à mensagem escapista que ouvem nos púlpitos de suas igrejas.

Se não há nada que se possa fazer para mudar as coisas neste mundo, o que fazer? Imaginar que haja outro mundo, oposto a tudo o que vemos aqui, parece uma saída plausível.

Em vez de incentivar os crentes a descruzarem os braços e trabalharem pela transformação do mundo, tal posicionamento estimula a indiferença, e a desesperança quanto ao futuro da humanidade.

Há pregadores que afirmam categoricamente que as coisas precisam piorar, para que Jesus Se apresse em retornar à Terra.

Ora, se o mundo está prestes a pegar fogo, por que nos preocupar com o seu futuro? Por que nos preocupar com questões como distribuição de renda, preservação do meio-ambiente, educação, ética nas pesquisas científicas, e etc.?

A igreja entrou de sola no negócio de ganhar almas, e assim, “povoar o céu”. Porém, a igreja primitiva estava envolvida em outro empreendimento: transformar o mundo.

Qualquer espiritualidade que não esteja comprometida com a realidade, está a serviço dos poderosos deste mundo, e é completamente dispensável para Deus.

Celebrações dominicais, vigílias, congressos, campanhas evangelísticas, se tornam apenas em passatempo, incapazes de estreitar nossa comunhão com o Criador. Ele mesmo é quem protesta:

“De que me serve a multidão dos vossos sacrifícios, diz o Senhor? Já estou farto dos holocaustos de carneiros, e da gordura de animais cevados (...) Quando virdes à minha presença, quem requereu isto das vossas mãos, que viésseis pisar os meus átrios? Não continueis a trazer ofertas vãs! O incenso é para mim abominação, e também as luas novas, os sábados, e a convocação das congregações; não posso suportar iniqüidade, nem o ajuntamento solene. As vossas luas novas, e as vossas solenidades, a minha alma as aborrece. Já me são pesadas; estou cansado de as sofrer. Pelo que, quando estendeis as vossas mãos, escondo de vós os meus olhos; sim, quando multiplicais as vossas orações, não as ouço. As vossas mãos estão cheias de sangue; lavai-vos, e purificai-vos. Tirai a maldade dos vossos atos de diante dos meus olhos! Cessai de fazer o mal, e aprendei a fazer o bem! Praticai o que é reto, ajudai o oprimido. Fazei justiça ao órfão, tratai da causa das viúvas”. ISAÍAS 1:11a,12-17


Até que ponto a igreja de hoje não está incorrendo no mesmo erro de Israel dos tempos de Isaías?

Estamos craques em oferecer cultos que são verdadeiros shows, com direito a efeitos especiais e tudo mais. Mas será que Deus tem recebido nosso culto? Será que Ele Se deixa impressionar com nossas parafernálias tecnológicas?

De um lado encontramos igrejas extremamente litúrgicas, onde a forma se sobrepõe ao conteúdo. Do outro lado, temos as igrejas modernas, desprovidas de ritos, mas preocupadas em apresentar um show que vá de encontro aos anseios do homem moderno.

As pessoas não são incentivadas a oferecer culto a Deus, mas a serem tão-somente expectadoras. Elas vão à busca de bênçãos, e não para oferecerem a Deus suas vidas, seus dons, seu serviço.

Ao despedir-se dos crentes, o ministro pronuncia a bênção apostólica, mas não lhes comissiona a mudar a realidade.

Miquéias expressa a preocupação que todos deveríamos ter com relação ao culto que prestamos a Deus:

“Com que me apresentarei ao Senhor, e me inclinarei ante o Deus excelso? Virei perante ele com holocaustos, com bezerros de um ano? Agradar-se-á o Senhor de milhares de carneiros, ou de miríades de ribeiros de azeite? Darei o meu primogênito pela minha transgressão? O fruto do meu ventre pelo pecado da minha alma? Ele te declarou, ó homem, o que é bom. E o que é que o Senhor pede de ti, senão que pratiques a justiça, ames a misericórdia, e andes humildemente com o teu Deus?” MIQUÉIAS 6:6-8

O sacrifício que Deus espera de nós é “fazer o bem e repartir com os outros” (Hb.13:16). Tal é a Justiça do Reino de Deus.

Que todos os crentes que lotam os mega-templos de hoje em dia, ouçam o clamor do Criador:“Pois eu quero misericórdia, e não o sacrifício, e o conhecimento de Deus, mais do que holocaustos” (Os.6:6). Não é Deus quem precisa de nossa misericórdia, e sim os necessitados deste mundo. Servi-los é servir a Deus.

E o critério pelo qual seremos julgados um dia é a misericórdia que houvermos demonstrado ao nosso semelhante. Por isso, bem-aventurados são os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.

Se quisermos agradar a Deus, temos que praticar a justiça, e amar a misericórdia, em vez de Lhe oferecer cultos desprovidos de sinceridade.


***
Hermes Fernandes é também culpado do que se faz aqui no Genizah
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Postar um comentário

  1. É isto mano Hermes! Triste lembrar que é o egoismo humano que se esconde atras destes sepulcros caidos. A maioria não jejua pelo justo e reto. A maioria não se ajunta para o outro, mas para si. Para a maioria os outros não passam de coadjuvantes e chaceladores de sua espiritualidade vazia. Testemunhas arranjadas de uma espiritualidade vazia, posto que se não aponta para a Cruz, aponta para a morte. E se aponta para a Cruz, há de ser renuncia e não esta busca insana pela satisfação transitória, enquanto o infindável se esvai das mãos.

    Não se ama o proximo. Não se encontra a Deus.

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  2. Parabéns Hermes.
    Texto de Deus.Citei no twitter tá?
    Que nosso Deus continue te iluminando cada dia mais.

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  3. É verdade... Antigamente a ética protestante deu impulso ao capitalismo no nosso mundo... Aparentemente, naquela época, o jeito que os crentes agiam influenciava o mundo em que viviam (para o bem ou para o mal, mas influenciava)! Atualmente, a ética capitalista é que dita as regras... Então temos essa alienação da realidade, o individualismo e o princípio da acumulação (de bens, pessoas etc. quanto mais, melhor) e ajudamos a multiplicar a injustiça...

    Não percebemos o quanto estamos longes da vida real... Só Jesus pra nos fazer enxergar!

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